Entrevista recente com Achille Mbembe, autor de “Necropolítica” e “Crítica da Razão Negra”

“Existe um explícito parentesco entre a escravidão moderna, a predação colonial e as formas contemporâneas de apropriação e extração de recursos. Em cada uma dessas instâncias há uma negação constituitiva do fato de que nós humanos co-evoluímos com a biosfera, dependemos dela, somos definidos por e através dela, e devemos uns aos outros uma obrigação de responsabilidade e cuidado.

Uma diferença importante é a escala tecnológica que levou à emergência do capitalismo computacional dos nossos tempos. Não estamos mais na era da máquina, mas na era do algoritmo. Essa escalada tecnológica, por sua vez, ameaça tornar todos nós em artefatos – o que eu chamei em outro momento de “tornar-se-o-negro-do-mundo” – e em tornar redundante uma grande parte do poder muscular do qual o capitalismo dependeu por muito tempo. O que se segue é que hoje, apesar de seu principal alvo seguir sendo o corpo humano e as matérias da terra, a dominação e a exploração estão se tornando cada vez mais abstratas e reticulares. Como repositório dos nossos desejos e emoções, sonhos, medos e fantasias, nossa mente e nossa vida psíquica se transformaram em matéria-prima sobre a qual o capitalismo digital busca capturar e transformar em mercadoria.

Nos tempos de Rhodes, a exploração do trabalho negro andava de mãos dadas com uma forma virulenta de racismo. O capitalismo contemporâneo ainda depende desses subsídios raciais. Mas as tecnologias de racialização têm se tornado cada vez mais pérfidas e abrangentes. Na medida em que o mundo se transforma num grande empório de dados, as tecnologias de racialização serão cada vez mais geradas e instituídas através de dados, cálculos e computação. Em resumo, o racismo está se realocando ao mesmo tempo sob e sobre a superfície da pele. Ele se reproduz através de telas e espelhos de vários tipos. Tem se tornado ao mesmo tempo espectral e fractal…”

http://afita.com.br/outras-fitas-descolonizacao-necropolitica-e-o-futuro-do-mundo-com-achille-mbembe/?fbclid=IwAR0yjwaYrsKYksfpUIUk62iBHWoRJWUTM7RAEjgql3OM7AWuYiFYXrnqiRM

Oficina Atrevidas na Semana Universitária da UnB/ 2019

Roda de conversa sobre a história da arte decolonial e feminista na Concha Acústica do Instituto de Artes da Universidade de Brasília. Começamos com a oficina de encadernação; discutimos a decolonialidade e o feminismo em artes; conversamos sobre as questões específicas, relacionadas a estes temas, da universidade e do Distrito Federal e do Entorno; distribuímos o material editado por artistas que compila as informações sobre a ausência de artistas mulheres e negrxs em principais manuais de história da arte; começamos a exibição de vídeo com a performance de Michelle Mattiuzzi “merci beaucoup, blanc! ” – e soaram os tambores, e caiu a primeira chuva do ano encerrando o período da seca

começando a oficina de encadernação
materiais para a encadernação
cadernos prontos)))
costurando

Fotografias: Marcelo Santiago

Performances, body arte e necropolíticas com Edilson Militão

Na Quinta-feira , às 19 hs, na UnB, numa das salas do ICC, Edilson falará sobre as metodologias de pesquisa e de produção acadêmica que nomeia de “rotas de fuga”:
“Relacionando as metodologias de pesquisa e de escrita com a importância da fugitividade, que é um babado que a Jota Mombaça fala bastante: “era impossível fugir, mas mesmo assim nós insistíamos na fuga”. Compreendendo uma metodologia de pesquisa que se propõe a pensar subversões (fugas) à  uma academia branca, eurocentrada e racista como a brasileira, como na minha experiência de TCC. Meu diploma não deixa de ser uma alforria. Uma fuga do encarceramento em massa eminente pra população que ocupa os marcadores sociais que eu ocupo (o privilégio da universidade). Ao mesmo tempo que estou usando dos métodos da universidade, me apropriando dos autores brancos e dos escritos de colonos herdeiros eu os utilizo para evidenciar que essa História “oficial” é branca e tendenciosa. Que esse sistema que hoje eu utilizo pra transitar na academia é o mesmo sistema que assassina meu pai numa fila do SUS e o mesmo sistema  que tenta me expulsar da universidade quando eu decido expor o racismo do qual fui alvo. É pensar práticas antirracistas na minha pesquisa e prática em artes visuais, especificamente na performance”, – palavras da artista.
Na Sexta-feira, às 19 hs, no Auditório do VIS/ IdA, estaremos conversando com Edilson sobre as performances políticas em artes x(versus) performances de entretenimento, tão em voga hoje em dia. Falaremos das performances de grupos artísticos da Rússia como as Pussy Riots (as mais famosas por aqui), o grupo Voina, o artista Piotr Pavlênski. Será uma conversa sobre o esvaziamento da potência da performance artística na arte contemporânea, sobre seu uso para a exposição narcísica de subjetividades brancas, hegemônicas, pautadas no eurocentrismo – por um lado; e, por outro, sobre a performance artística como uma das linguagens mais potentes em contextos autoritários, racistas e patriarcais – quando praticada a partir de exercício de consciência social e de subversão.

No Sábado, às 14 hs – na CAL Edilson fará uma palestra/conversa sobre “Performance, body arte e necropolíticas“.

Edilson Militão (Cariri-Brasil, 1994) é artista visual, performer e poeta. Licenciada em Artes Visuais pela URCA – Universidade Regional do Cariri (2019) – CE. Desenvolve trabalhos artísticos pautados em sua pesquisa acadêmica em performance arte, body art e necropolíticas. Investiga questões subjetivas e ficcionais ao próprio corpo enquanto identidade política e de seus ancestrais através da história oral de sua família.
Em 2019 defendeu o TCC “Alegoria da Loucura – processo de criação em Performance Arte e taxonomias performativas” com a banca formada por artistas/pesquisadoras renomadas como a Bia Medeiros e a Kaciano Gadelha. Seu trabalho de “modestas” 200 páginas foi elogiado pela banca ao ponto de sugerir que seja transformado em doutorado. A defesa deste TCC foi uma imensa vitória. Durante a graduação Edilson denunciou por meio de performances o racismo na universidade, foi perseguida; as instituições repressoras do estado foram acionadas (SAMU e polícia) para reprimi-la.
Em seus trabalhos artísticos Edilson reflete sobre a colonização do Cariri cearense, sobre a violência da história colonial, sobre as sobrevivências de resistências, sobre a atemporalidade, a ancestralidade; sobre ser e viver de uma bicha preta nordestina no Brasil e no mundo.

Cartaz: logo de Atrevidas por Laíse Frasão, arte por Marcelo Oliveira, fotografia por Rodrigo Belem